Produtos sem glúten no Brasil: a realidade por trás dos rótulos
No Brasil, aproximadamente uma em cada 250 pessoas convive com a doença celíaca, uma condição crônica e autoimune em que o organismo rejeita o glúten, proteína presente em alguns cereais. Os sintomas da doença podem variar, incluindo distúrbios digestivos como diarreia, prisão de ventre, anemia, sensação de inchaço e dores abdominais, dificultando a absorção de nutrientes essenciais.
Diante dessa situação, a confiança nos rótulos dos alimentos é fundamental para garantir a segurança alimentar de quem precisa eliminar o glúten da dieta. Mas será que os produtos rotulados como “não contém glúten” no mercado realmente atendem a essa exigência? Uma recente análise testou 23 produtos com a indicação “não contém glúten” e revelou que um desses alimentos apresentou glúten acima do esperado, configurando uma violação da legislação vigente.
O que é glúten e por que os celíacos devem evitá-lo?
O glúten é uma mistura de proteínas encontradas no trigo, centeio, cevada e aveia. Para pessoas com doença celíaca, essa substância danifica o intestino delgado, comprometendo a absorção de minerais e vitaminas, como ferro, cálcio e vitamina D. Por isso, o controle rigoroso dessa proteína na alimentação é indispensável para evitar sintomas desagradáveis e problemas de saúde a longo prazo.
A única forma eficaz de controle da doença é a adoção de uma dieta completamente livre de glúten por tempo indeterminado. Assim, saber identificar corretamente os alimentos que não contêm glúten é uma questão de saúde e qualidade de vida para os celíacos.
Apesar disso, identificar com segurança os alimentos sem glúten depende exclusivamente da leitura precisa do rótulo. No Brasil, conforme a Lei Federal nº 10.674/2003, todos os produtos industrializados são obrigados a informar a presença ou ausência de glúten com as indicações “contém glúten” ou “não contém glúten”.
Análise de 23 produtos classificados como “não contém glúten”
Foram selecionados 23 alimentos que possuíam a etiqueta “não contém glúten” e classificados em seis categorias distintas para análise detalhada. Esses produtos foram adquiridos em lojas especializadas em produtos naturais e sem glúten na cidade de São Paulo, garantindo a variedade e representatividade da oferta disponível ao consumidor.
A avaliação foi feita em laboratório certificado pelo Inmetro, utilizando o método ELISA (Enzime-Linked Immunosorbent Assay), uma técnica recomendada pelo Codex Alimentarius para detectar e mensurar a presença do glúten. Segundo essa referência internacional, alimentos classificados como livres de glúten devem conter, no máximo, 20 partes por milhão (ppm) de glúten.
Resultados do teste
Em um dos produtos avaliados, o macarrão penne Fit Food 500g, lote A, foram detectados níveis de glúten entre 14,57 ppm e 27,73 ppm em diferentes análises, superando o limite recomendado. Esse resultado representa um potencial risco para pessoas celíacas que consumirem esse lote específico, pois há contaminação que não deveria estar presente conforme a rotulagem.
Já os outros 22 produtos testados apresentaram níveis de glúten inferiores a 5 ppm, que é o limite de detecção do método utilizado, indicando que estavam dentro dos padrões esperados para alimentos sem glúten.
Importância da rotulagem correta e atuação da fiscalização
No Brasil, mesmo com a legislação que exige informações sobre alergênicos nos rótulos, a adequação da presença do glúten nem sempre está garantida. A Anvisa orienta que, caso haja qualquer risco de contaminação com glúten, a advertência “Contém glúten” deve constar claramente na embalagem para proteger o consumidor, especialmente aqueles com doença celíaca.
No caso do macarrão penne Fit Food, que é feito à base de milho, o rótulo não faz referência à presença inadvertida de trigo, centeio, cevada, aveia ou seus derivados. Dessa forma, não cumpre seu papel de informar e alertar de forma transparente os consumidores sobre eventuais riscos, prejudicando a segurança alimentar deste público específico.
Ações para garantir a proteção dos consumidores
Diante dos resultados da análise, as autoridades e órgãos de defesa do consumidor entraram com ações legais para retirar o lote do macarrão contaminado do mercado, além de solicitar ressarcimento aos consumidores que adquiriram o produto. Essa iniciativa reforça a importância da fiscalização ativa e do cumprimento rigoroso das normas de rotulagem para proteger a saúde dos celíacos.
Você sabia que ler o rótulo dos alimentos é a principal forma de garantir uma alimentação segura para quem tem restrições ao glúten? Conhecer a legislação vigente e os métodos de controle pode ajudar a evitar riscos desnecessários à saúde.
Dicas para identificar alimentos realmente seguros
- Confirme sempre a presença da indicação “não contém glúten” no rótulo;
- Prefira produtos certificados por órgãos reconhecidos que acompanham controles de qualidade rigorosos;
- Evite alimentos que não apresentam informações claras sobre alergênicos;
- Se possível, busque testes ou avaliações independentes publicados sobre os produtos;
- Desconfie de produtos muito baratos ou marcas desconhecidas sem histórico de bons controles;
- Consulte canais especializados em segurança alimentar para acompanhar atualizações sobre produtos e legislações;
- Mantenha contato com profissionais de saúde que orientem adequadamente sobre a dieta sem glúten.
Legislação sobre glúten no Brasil e padrões internacionais
A regulamentação brasileira obriga a rotulagem clara sobre a presença de glúten, mas não estabelece limites numéricos para quantidade tolerada. Por outro lado, o Codex Alimentarius, referência global em segurança alimentar, define o limite máximo de 20 ppm para alimentos que se intitulam sem glúten.
Essa disparidade evidencia a necessidade de aprimoramento nas normas locais para ajustar o mercado nacional aos padrões internacionais, ampliando a proteção ao consumidor celíaco.
Além disso, a recomendação da Anvisa faz com que qualquer alimento com possibilidade de contaminação contenha a advertência “Contém glúten”, aprimorando a transparência e o direito à informação.
A importância do controle de qualidade em produtos sem glúten
A contaminação cruzada é um dos principais desafios na produção de alimentos sem glúten. Mesmo produtos que não têm ingredientes contendo glúten podem entrar em contato com essa proteína durante o processamento, embalagem ou transporte, tornando indispensável um rigoroso controle em todas as etapas da cadeia produtiva.
Fábricas especializadas, linhas de produção exclusivas e treinamentos constantes para os trabalhadores são práticas recomendadas para evitar riscos. Do lado do consumidor, conhecer a procedência dos produtos e confiar em marcas que investem nesses cuidados traz mais segurança ao consumo.
Como o consumidor pode se proteger e garantir uma dieta segura
Se você é celíaco ou precisa seguir uma dieta sem glúten, é essencial manter atenção redobrada na escolha dos alimentos. Além de confirmar informações nos rótulos, sempre que possível, opte por alimentos naturais e frescos, que dificilmente contêm glúten em sua composição. Faça compras em estabelecimentos especializados e busque orientação profissional para a montagem de um cardápio equilibrado e livre de riscos.
Tem dúvidas sobre como identificar produtos seguros? Confira sempre os selos de controle, procure informações sobre o histórico da marca e mantenha-se informado sobre os direitos do consumidor, especialmente no que se refere às alegações de ausência de glúten.
Fique atento ao mercado e às novidades na legislação
As análises recentes mostram que mesmo alimentos que declaradamente não contêm glúten podem apresentar riscos, especialmente por falhas na produção ou na rotulagem. Por isso, é importante acompanhar notícias, fiscalizações, ações judiciais e atualizações da legislação para assegurar a segurança alimentar. O mercado de produtos sem glúten cresce, mas também exige maior responsabilidade e transparência por parte dos fabricantes.